quarta-feira, 7 de maio de 2014

Caso Galdino x Ressocialização

                No dia 20 de abril de 1997, aconteceu um dos fatos mais marcantes na história do país, cinco rapazes de classe média de Brasília atearam fogo no índio Galdino pataxó, de 44 anos, que dormia em uma parada de ônibus na Asa Sul, bairro nobre da capital federal. A vítima teve 95% do seu corpo queimado e não resistindo aos ferimentos foi a óbito.

            Transpassado quatro anos do cometimento do crime, os envolvidos Max Rogério Alves, Eron Chaves de Oliveira, Tomás Oliveira de Almeida e Antônio Novély Cardoso de Vilanova foram levados a julgamento pelo Tribunal do Júri de Brasília pela pratica de crime de homicídio triplamente qualificado. O quinto envolvido G.N.A.J., menor à época dos fatos, foi condenado a um ano de medida socioeducativa.

            Recentemente G.N.A.J., um dos envolvidos no homicídio do índio Galdino, foi aprovado em várias etapas do concurso público da Policia Civil do Distrito Federal e eliminado na etapa de avaliação da vida pregressa.

            O candidato impetrou mandado de segurança com pedido liminar, questionando a nulidade da sua eliminação. O pedido liminar foi deferido pela 5ª Vara da Fazenda Pública do Distrito Federal, que agora aguarda as informações que deverão ser prestadas pela autoridade coatora (Presidente da comissão de sindicância e vida pregressa da Policia Civil do Distrito Federal) , para poder julgar o mérito da ação.

            Esse fato tem levantado grandes debates nas redes sociais, entre juristas e populares, uns defendendo a eliminação e outros defendendo a decisão que permitiu a participação do candidato nas demais etapas do concurso.

            Sem adentrar no mérito do crime praticado pelo candidato, queremos analisar apenas a sua eliminação no concurso que, até onde sabemos, ocorreu com base no ato infracional praticado há 14 (quatorze) anos.

            O MM. Juiz de Direito da 5ª Vara da Fazenda Pública do Distrito Federal, ao conceder a liminar em favor do candidato, assim decidiu: “Atos infracionais, nomenclatura dada pelo Estatuto da Criança e do Adolescente às condutas análogas a crime praticadas pelo inimputável adolescente, não são crimes e com eles não se confundem. Dada a inimputabilidade daquele que, ao tempo do ato, não atingira a maioridade penal, o Estatuto menorista, em atenção ao princípio da proteção integral, buscou formas para ressocializar o adolescente infrator. Para isso, foram previstas medidas socioeducativas aplicáveis, isolada ou cumulativamente, a considerar suas necessidades pedagógicas (...) sendo certo que seu cumprimento não tem o condão de gerar maus antecedentes"

            No mesmo entendimento desposado pelo magistrado, está o do Advogado criminalista e conselheiro da Ordem dos Advogados do Brasil, seção São Paulo, Roberto Delmanto Junior afirma: “Pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), o passado é apagado assim que ele completa 18 anos ou cumpre a medida socioeducativa”.

            Vivemos em um país democrático de direito que prevê, dentre uma das funções da pena a ressocialização ou reeducação do agente.

            A avaliação de vida pregressa dos candidatos deve ser realizada de maneira objetiva levando em consideração os aspectos de relevância praticados em períodos determinados, evitando a aplicação de pena perpetua e o descumprimento da função de ressocialização da pena.

            Se o Estado é o primeiro a “fechar as portas” para pessoas que um dia cometeram um crime ou ato infracional, e que buscam uma ressocialização, estaremos chancelando o fracasso da pena no sistema penal brasileiro, aplicando a pena perpetua ofendendo a Constituição e estimulando a reincidência de pessoas que um dia já cometeram algum crime. Em outras palavras, viveremos em uma sociedade hipócrita que reprova a pratica de crimes e ao mesmo tempo estimula a sua pratica ao impedir a ressocialização das pessoas.

            Também não podemos levar em consideração o aspecto moral do candidato a época da pratica do ato infracional, já que decorridos 14 anos, vez que a moral é mutável e se firma na realidade das épocas.
           
             Acontecimentos históricos moldam a moral coletiva enquanto acontecimentos privados moldam a moral individual. Sendo assim, deve ser analisado o aspecto moral do candidato de forma atual e comparativa com o seu passado, verificando se houve evolução, retrocesso ou estagnação.


            Portanto, acertada a decisão do MM. Juiz Carlos Fernando Fecchio dos Santos, que levou em consideração aspectos de extrema importância, dentre eles o de assegurar ao candidato a sua chance de se reinserir na sociedade.

Dr. LAERTE QUEIROZ
Advogado do escritório Laerte Queiroz Advogados Associados
Advogado da Federação de Basquete do Distrito Federal
Pós-graduado em Ciências Penais
Membro da Comissão de Direito Administrativo e Controle das Agências Reguladoras da OAB/DF

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